quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Do Espírito de Natal

 
 
Sempre adorei o Natal e toda a temática inerente a esta altura do ano.
 
A minha Mãe vibrava com as decorações da casa, fazer a árvore de Natal e construir o presépio, feito com figuras já muito antigas e um estábulo com manjedoura feito pelo meu Avô. Sem esquecer a sua colecção de Pais Natal, de todos os tipos e tamanhos, uns mais antigos do que outros, todos únicos e escolhidos "a dedo".
 
No ano em que a minha Mãe partiu, já lá vão 15 longos anos (como o tempo passa, meu Deus, às vezes sinto como se tudo tivesse acabado de acontecer há poucos instantes...), fiz questão de honrar o seu gosto e, sozinha, decorei a casa e preparei uma mesa como se toda a família fosse estar presente. Éramos apenas eu e o meu Avô, mas coloquei uma pedra em cima da tristeza e, por todos nós (presentes a ausentes), tentei ultrapassar a dor da ausência, a saudade da Alegria e a nostalgia dos Natais passados.
 
Os anos que se seguiram já foram um pouco diferentes. A partir da morte do meu Avô (há 10, quase 11 anos), o Natal deixou de me fazer sentido, de me dar Alegria, por muito que sempre tenha tentado mantê-lo vivo em mim e junto dos que me rodeavam. A certa altura, simplesmente baixei os braços e desisti. Não me sentia com forças para, sozinha, fazer tudo de novo vez após vez, ano após ano, quando ninguém apreciava ou, sequer, dava valor. Deixei que essa parte de mim fosse esmorecendo cada vez mais, até se tornar uma simples sombra, uma vaga recordação.
 
Como na Vida"não há bem que sempre dure nem mal que não acabe", após alguns anos bem difíceis, voltei a ter uma Família digna desse nome. Bem grande, por sinal. Olhando para trás (mas apenas por um breve instante, pois o que importa é o momento presente), sinto e reconheço como verdadeiras as palavras que fui escutando ao longo da Vida: "Quando Deus fecha uma porta, abre sempre uma janela"; ou "Deus tira com uma mão e dá com a outra".
 
De facto, perdi tudo (menos o tecto, felizmente). Pais, avós, família, dinheiro. Aos poucos, reergui-me (não sem ajudas, mas graças a elas: Amigos, Profissionais de Saúde e até estranhos).
 
Construí uma família de quatro patas (caninas e felinas) que me manteve agarrada à Vida, me fez lutar para me reerguer e me obrigou a restruturar e reorganizar de dentro para fora.
 
Depois, uma família humana. Amigos verdadeiros, aqueles que nos dizem as coisas como são, não como achamos que devam ser; com quem nos zangamos e deixamos de falar, mas estão sempre lá; que nunca nos desamparam e sabem sempre ouvir; que até podiam ser família de sangue mas pertencem a um parentesco muito mais especial (pelo menos para mim): o da Família que, com tudo o que tenho aprendido (e continuo a aprender), escolhi e quero manter a meu lado, para que possamos caminhar juntos ao longo desta aventura chamada Vida.
 
Por fim, e porque os últimos também são os primeiros, um marido e um enteado, agora uma filha (que me disseram não poder ter) que cresce a uma velocidade estonteante e tem em si tudo o que mais amo e prezo: Alegria, Amor, Espontaneidade, Felicidade, Saúde.
 
Este ano, estamos quase no Natal. Ainda não fiz a árvore, nem montei o presépio. Pouco ou nada decorei a casa. Não consigo achar a mínima graça aos anúncios mercantilistas que, ano após ano, começam a ser transmitidos cada vez mais cedo (seja na rádio ou na televisão) e por demasiado tempo. Tiram-me a vontade de preparar o que quer que seja! O apelo desenfreado ao consumo faz-me desejar que esta época passe num instante, porque esse lado do Natal passa-me ao lado, não me diz nada. Ou melhor, faz-me dizer: Não gosto. Não quero. Para mim, o Natal não é isto, não é nada disto.
 
Não sou hipócrita. Claro que gosto de receber e ainda mais de oferecer uma lembrança, trocar postais (cada vez mais raros). Gosto, sim. Muito mesmo, mas apenas isso, lembranças. Não prendas XPTO que, no momento seguinte, não passam de objectos esquecidos e largados algures. São lembranças feitas por mãos grandes ou pequeninas, pequenos mimos que digam "gosto muito de ti", "lembrei-me de ti", "tive saudades" ou "obrigada". Um bolo, umas bolachinhas, um cartão. Estas sim, são as lembranças que me dizem algo, que me fazem sentir e viver o Natal.
 
Poder estar junto de quem amo, reencontrar, rever e conviver com amigos de longa data e colocar a conversa em dia, reunir em volta de uma mesa que tenha o suficiente para que nos sintamos bem e poder partilhar uma refeição entre todos, com gosto e sem pressas.
 
No mundo em que vivemos, na sociedade que nos rodeia, tudo isto parece esquecido. E é triste.

Talvez por isso, este ano, o Espírito de Natal esteja ainda adormecido em mim.
 
A ver se o consigo despertar a tempo.

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